quinta-feira, 4 de agosto de 2011

[desenhos] um pedacinho do Brasil na Disney completa 70 anos!

Disney/Divulgacao
Pato Donald e Zé Carioca no filme Alô, amigos: americanos e brasileiros descobrem
juntos os segredos da latinidade em meio a muita música


Por Marcello Castilho Avellar - EM Cultura

Da célebre viagem de Walt Disney ao Brasil, em 1941, nasceu o personagem, uma das figuras mais populares das HQs e do cinema de animação


Hollywood tem suas lendas. E uma delas está completando 70 anos em 2011. A certidão de nascimento “oficial” do Zé Carioca, o papagaio brasileiro que integra a galeria de personagens da Disney, diz que ele nasceu em 24 de agosto de 1942, quando o desenho animado Alô, amigos estreou no Rio de Janeiro, antes mesmo de seu lançamento americano. A mitologia hollywoodiana, contudo, diz que a data está errada. Segundo essa versão, Zé Carioca teria surgido em 1941, durante uma visita de Walt Disney ao Brasil. A história dá até o local do nascimento: o restaurante do Hotel Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, onde Disney teria desenhado o personagem num guardanapo.

Verdade ou lenda, o Zé Carioca é filho da Segunda Guerra Mundial. No início de 1941, os Estados Unidos ainda não haviam sido atacados pelos japoneses, mas assistiam com preocupação à expansão deles no Pacífico. Em relação à Europa, apoiavam abertamente os ingleses em sua resistência contra a agressão alemã. O governo americano de Franklin Roosevelt nem ao menos se preocupava em fingir neutralidade: reconhecia-se como não beligerante, um país que não participava da guerra mas se posicionava firmemente em relação a ela. Percebendo a iminência de um choque com o Japão, o Departamento de Estado americano decidiu iniciar nova etapa na good neighbour policy (política de boa vizinhança): se o país entrasse em guerra, seria bom que suas costas estivessem bem protegidas. E, para isso, era necessário reduzir o sentimento antiamericano em diversas sociedades da América Latina. A célebre viagem de Walt Disney ao Brasil, Argentina, Chile e Peru foi parte dessa ofensiva sobre os corações e mentes no continente.

Disney, sua mulher Lilly e um séquito de 18 profissionais dos estúdios do produtor desembarcaram de um avião do Departamento de Estado no Aeroporto Santos Dumont em agosto de 1941, quatro meses antes do ataque japonês a Pearl Harbor. Não ficaram apenas hospedados no Copacabana Palace – montaram ali uma espécie de miniatura dos estúdios que Disney e seu irmão Roy controlavam em Burbank, na Califórnia, de modo que os visitantes brasileiros pudessem ter conhecimento de como funcionava a criação de um desenho animado.

Nesse processo, Walt entrou em contato com diversos artistas brasileiros e suas criações. Um deles, José Carlos de Brito e Cunha, o primeiro desenhista brasileiro a representar Mickey Mouse, impressionou tanto Walt Disney que foi convidado por ele a se unir à equipe nos Estados Unidos. Não aceitou, mas mostrou ao produtor o desenho de um papagaio vestido de gente – que teria sido a principal inspiração para Disney na criação de seu herói.

Se a viagem de Disney ajudou a resolver um problema diplomático do governo Roosevelt, serviu, também, para ajudar a Disney a solucionar problemas financeiros. Com a guerra, o importante mercado cinematográfico europeu, à exceção do Reino Unido, havia sido fechado para os filmes americanos (antes do conflito, a Europa respondia por metade das rendas de Hollywood). A viagem à América Latina estabeleceu laços mais fortes com os países do continente, o que ajudou no bom desempenho que Alô, amigos teve por aqui, e beneficiou o estúdio nos países onde ainda não haviam sido lançados seus filmes mais antigos.

Ao longo dos anos 1960 e 1970, com o avanço de uma crítica ideológica às criações Disney, Zé Carioca tornou-se alvo fácil. O fato de ser nitidamente uma caricatura do Brasil, e de construir esta caricatura a partir de uma das representações que costumam ser mais desconfortáveis para o brasileiro contemporâneo (o malandro que detesta trabalhar, vive na farra, recusa qualquer compromisso e se interessa apenas por samba e futebol), mais de uma vez o colocou na lista dos que criticam criações politicamente incorretas. Não importa: seu humor vem provocando o interesse dos leitores e espectadores geração após geração. E se aceitamos a ingenuidade da representação, ela traz consigo algo importante: a representação, mesmo que superficial e estereotipada, do brasileiro como povo singular.


Curiosidades

» Zé Carioca chegou aos quadrinhos numa tirinha de jornal publicada entre 1942 e 1945 e desenhada por Paul Murry, um dos mais importantes criadores de histórias do Mickey e responsável pelo aparecimento de personagens importantes do universo Disney, como o coelho Quincas, o Supergilberto (sobrinho do Superpateta) e o vilão Dr. Estigma.

» A revista Zé Carioca, da Editora Abril, é uma das mais antigas publicações em quadrinhos do Brasil. Ela começou a circular em 1961 – mas sua primeira edição recebeu o número 479, porque as histórias da personagem, desde 1950, eram apresentadas em O Pato Donald. Desde então, os números pares das publicações gêmeas são dedicados à última, e os ímpares a Zé Carioca.

» Outra história que sempre corre em Hollywood sobre o nascimento do Zé Carioca é ambientada em 1942. Quando concluía os esboços do que seria o filme Alô, amigos, Walt Disney teria sido apresentado ao músico José do Patrocínio Oliveira, que, segundo seus amigos, era cheio de trejeitos. Zé Carioca teria sido inspirado nele. É a voz de Oliveira que escutamos na versão brasileira de Alô, amigos.

» O sucesso de Alô, amigos e a continuação da política de boa vizinhança levaram a Disney a realizar outro longa de animação com heróis latino-americanos. Você já foi à Bahia, que estreou em 1944, também é protagonizado por Zé Carioca, que divide a tela com o Pato Donald e o galinho mexicano Panchito.

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